A nova normalidade cansa

Para quem achava que o isolamento social seria uma situação temporária, já se vão quase três meses e o Brasil ainda não alcançou o pico da epidemia. Acredito que é possível olhar para trás e refletir um pouco sobre como está sendo e como será a nova normalidade.

Para além da questão do bem e do mal, a nova normalidade tem sido, acima de qualquer coisa, bastante cansativa. A rotina doméstica, por exemplo, inclui agora ritos de limpeza da casa e uma atenção redobrada para a higiene. O tempo diante da tela de celular, tablet e computador também gera uma fadiga, não apenas pela emissão constante de luz, mas pelo volume de informações que se absorve durante o dia.

A necessidade de adaptação também consome um esforço significativo, principalmente porque ocorreu sem qualquer preparo. Em muitos casos, a rotina familiar precisou ser reinventada em poucas semanas e a intensidade do convívio aumentou repentinamente. Os horários de refeição e sono foram alterados porque referências foram se perdendo pela falta de atividades que regulam o cotidiano.

Por fim, viver fora de casa requer uso de máscara, portar álcool em gel e controlar a distância mínima de outras pessoas. Qualquer mínima aglomeração desencadeia ansiedade e reforça a neurose de limpeza. Sair de casa pode constituir um suplício cada vez maior, uma vez que o comércio está retomando as suas atividades e as ruas se enchem de gente.

Todas essas mudanças, associadas à perda de horizonte que nos atinge pelas incertezas, provocam um cansaço emocional. Os relatos clínicos já dão conta dessa nova normalidade. Provavelmente, esse período esticado de estresse vai favorecer um aumento de casos de depressão, suicídios e, considerando o abuso nas relações de (tele)trabalho, burnout também. Se a sociedade não se sentir capaz de lidar com essa pressão, haverá nesse mesmo ritmo um aumento na prescrição de medicações controladas. Embora isso seja necessário em várias situações, pode ser evitada em tantas outras.

É fundamental desenvolver um nível maior de tolerância e aceitar que o mundo atravessa profundas transformações. Não se pode prever o que está por vir, porém devemos lidar com esse cansaço para manter a saúde física e mental. As cobranças devem dar lugar à compreensão e ao afeto para compensar a falta ou redução do contato físico.