Obesidade infantil e família na revista VEJA

VEJA publica matéria “A culpa é dos pais” sobre a influência da família na obesidade infantil

Na edição de 21 de dezembro de 2016 da revista VEJA, as jornalistas Carolina Melo e Thaís Botelho assinaram a matéria “A culpa é dos pais”, abordando a responsabilidade dos pais no crescimento da obesidade infantil. Considero a reportagem um grande avanço, pois não me recordo de ver qualquer matéria em jornais impressos ou televisivos a respeito da obesidade infantil sob a perspectiva familiar.

As estatísticas e pesquisas mencionadas na reportagem são, de fato, muito preocupantes. É oportuno associar a queda na expectativa de vida à má alimentação das famílias. E mais: é fundamental entender que os esforços para controlar a produção de alimentos não são suficientes para impedir os hábitos alimentares inadequados. Mudar o foco da solução desse problema para a sociedade é um passo inevitável nos dias de hoje. Entretanto, a promessa do título da matéria não se cumpre…

Se a culpa (prefiro a palavra responsabilidade) da obesidade infantil é dos pais, poderíamos imaginar uma matéria que abordasse a relação entre pais e filhos, mas a VEJA acabou resumindo o problema na tipificação de condutas parentais. Ou seja, “existem pais que são negligentes, outros controladores etc. Faça um teste rápido e veja em qual tipo você se enquadra!” Nos últimos anos, a pesquisa sobre o tema no Brasil tem publicado alguns títulos que oferecem uma perspectiva mais complexa sobre a influência familiar na obesidade infantil, entre os quais cito o livro da Professora Valéria Tassara, “Obesidade na infância e interações familiares: uma trama complexa”, e o meu, “Obesidade infantil: interações familiares e ciclo de vida numa perspectiva sistêmica”.

Embora a iniciativa da revista VEJA tenha sido louvável, caiu na visão tradicional da obesidade. Em primeiro lugar, se a “culpa” da obesidade infantil está na relação pais e filhos, por que não abordar a questão sob a ótica da psicologia? É perceptível como a obesidade ainda é algo que se trata apenas pelo viés do corpo, sem considerar a íntima conexão entre corpo e mente; e em segundo lugar, se a responsabilidade é dos pais, como é possível transformar a relação com os filhos para mudar essa realidade?

Não há como simplificar o tratamento da obesidade, que deve ser interdisciplinar, e tipificar os pais e condená-los ainda está longe de ser a solução. Vamos compreender o que ocorre nessas famílias com crianças obesas e colocar o foco na relação entre pais e filhos. A alimentação não é o único problema, nem só um problema que afeta exclusivamente as crianças da família. É preciso pensar na família como um todo, que sofre junta e tem na alimentação o seu sintoma visível.

Os livros citados acima introduzem a teoria sistêmica, que serve hoje como grande aporte para compreender melhor como a família “alimenta” a obesidade das crianças. Acredito que outras matérias vêm por aí e fico na expectativa de que esses aspectos sejam tratados de maneira satisfatória.

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