Ao longo do século XX e início do século XXI, fomos contínua e crescentemente expostos ao consumo em uma sociedade do espetáculo, como preconizou Guy Debord na década de 1970. Esse fenômeno teve um crescimento significativo com a popularização da internet, que pelas redes sociais deu projeção não apenas ao cidadão extraordinário, mas sobretudo ao ordinário. O avatar, como sugere o filme homônimo, protagonizou as relações sociais que ocuparam cada vez mais o espaço virtual.
Com a sofisticação das relações virtuais, o indivíduo passou a se definir em função do que comia, como se vestia, o que escutava, onde frequentava e para onde viajava. Essas são as referências usadas pelos algoritmos para sugerir contatos entre os avatares nas redes sociais e, portanto, tornaram-se os critérios de pertencimento para determinados grupos sociais.
Se o distanciamento social provocado pela pandemia enfatizou a necessidade das redes sociais como forma de interação social, teve no medo da escassez e do caos um elemento desorganizador de nossas imagens. De que vale incrementar o nosso avatar quando nos voltamos para a manutenção da vida? Muitos se perguntam se não é hora de resgatar valores altruístas e essenciais para a vida coletiva.
Como dizem os essencialistas, será que não havia ruído em excesso no estilo de vida contemporâneo? A filosofia oriental e as terapias new age já chamavam a atenção para a postura contemplativa diante da vida, para a capacidade de silenciar e tolerar os nossos próprios incômodos internos. Esses já são ruidosos o suficiente. O sintoma para tal esgotamento da capacidade humana para a demanda capitalista foi o burnout.
Eis que agora estamos confinados e pesando o que é essencial em nossas vidas, sem controle algum sobre o futuro. O espetáculo perdeu aquele glamour e já começamos a sentir o luto, a angústia das perdas, tanto imateriais como materiais. O mundo está em transição e, ainda que isso não seja uma garantia de que seja para melhor, talvez acabe despertando a necessidade de ser melhor em cada um.